Talvez a autobiografia mais bem escrita que eu já tenha lido. Incrível!
Andre Agassi na minha infância era mais um tenista que disputava campeonatos com meu esportista preferido, Guga Kuerten. Então ler esse livro foi desvendar esse personagem que desde o início de sua história admitiu pra ele mesmo: “Eu odeio tênis!”. Sim, isso mesmo.
Me fez quebrar ideias do famoso “ter que ser apaixonado pelo que faz todos os dias da vida”, dentre outros pontos. A vida é um pouco mais complexa que isso e todos temos fases. Inclusive, Agassi foi até corajoso de expor tantas coisas positivas, como Grand Slams que ganhou, quanto coisas negativas, como o envolvimento com metanfetamina.
Obrigado pela indicação meus queridos amigos Gabriel Kalil e Rodrigo Vansuita. Essa é pra vocês.
- Jogo tênis para viver, embora deteste esse esporte. Detesto o tênis com uma paixão secreta e sombria, e sempre detestei.
- Saber como seu nervosismo se manifesta, o que ele revela sobre sua cabeça e seu corpo, é o primeiro passo para tirar o melhor proveito possível da situação.
- Se alguém colocar um par de meias lá dentro, sem eu ver, sou capaz de sentir a diferença de peso. A sacola de tênis é quase como o coração—a gente precisa saber exatamente o que há lá dentro, o tempo todo.
- Desordem equivale a distração e, dentro da quadra, qualquer distração pode significar uma reviravolta no jogo.
- Minha memória não é como a minha sacola de tênis: não consigo controlar o que há lá dentro. Tudo entra e nada parece sair.
Continuo implorando a mim mesmo para parar, mas sigo na quadra, e esse descompasso, essa contradição entre o que eu quero fazer e o que eu realmente faço, parece ser o centro da minha existência.
- Meu pai gasta muito dinheiro investindo em mim e, quando eu perco, lá se vai outra fatia de seu investimento. Quando eu perco, atraso toda a família Agassi.
- Se meu time não ganhar, a responsabilidade é da equipe inteira, e não vai haver alguém berrando na minha orelha. Acho os esportes coletivos bem melhores.
- Além disso, meu adversário é ruim, e isso me coloca em desvantagem. Jogo pior quando enfrento oponentes mais fracos. Acho que passo para o nível deles. Não sei como manter o meu ritmo de jogo enquanto me ajusto ao adversário, pois é como ter de inspirar e expirar ao mesmo tempo. Contra adversários fortes, correspondo ao desafio. Contra adversários piores, eu travo, não deixo as coisas acontecerem.
- No fundo, não estou fazendo nada a não ser tentar ser eu mesmo e, como não sei quem eu sou, minhas tentativas de descobrir são disparatadas, desajeitadas e, é claro, contraditórias.
- Ele garante que as coisas vão melhorar assim que eu começar a ganhar torneios de Grand Slam. Ganhar? Para quê? Por que as vitórias mudariam a opinião que as pessoas têm de mim? Vencendo ou perdendo, ainda sou o mesmo cara. É por isso que tenho de vencer? Para calar a boca das pessoas? Para satisfazer um bando de jornalistas e repórteres que não me conhecem?
- Conto minha história, de um jeito solto e desorganizado, e ele tem a habilidade de Perry de recontar o que ouve, com tudo fazendo sentido, usando palavras muito apropriadas. Ele entende minhas contradições e me ajuda a entender algumas delas.
Não sei, mas você vai resolver isso. É uma crise passageira, Andre. Uma de muitas. Tão certo como o fato de estarmos sentados aqui é que outras crises virão. Maiores, menores, de todos os tamanhos. Encare esta como um treino para a próxima.
- Mais uma vez, não vou para Wimbledon. Outra enxurrada de insultos da mídia. Agassi não vence os torneios importantes em que entra e deixa de ir aos que realmente são relevantes. Mas, para mim, isso é uma gota no oceano. Estou me tornando insensível.
- Rio mais do que ri a minha infância inteira e, apesar de uma dose de histeria, essas risadas ajudam a curar feridas. Durante algumas horas, tarde da noite, o riso faz com que eu me sinta o antigo Andre, seja ele quem for.
- E eu penso em como me sentiria melhor se fizesse parte de um time.
- QUANDO VOLTO PARA o ginásio da universidade, vejo no rosto de Gil que ele estava me esperando. Apertamos as mãos. É o começo de algo novo.
- ALGUMAS VEZES, uma sessão de musculação com Gil é, na verdade, um papo. Não tocamos num único peso. Sentamos nos bancos e conversamos à vontade. Há muitas maneiras de ficar forte, diz Gil, e, em certas ocasiões, conversar é a melhor delas.
- Ele ficou abalado com Roland Garros, como eu. Uma manhã, antes de o sol se levantar, ele me conta algumas palavras que sua mãe sempre lhe diz. Qué lindo es soñar despierto. Como é bom sonhar acordado. Sonhe enquanto estiver acordado, Andre. Qualquer um pode sonhar enquanto dorme, mas você precisa sonhar o tempo inteiro, falar seus sonhos em voz alta e acreditar neles.
Não posso prometer que você não vai se cansar, diz ele. Mas, por favor, saiba disso. Há muita coisa boa esperando você do outro lado do cansaço. Canse-se, Andre. É aí que você vai se conhecer. Do outro lado do cansaço.
- Então, em vez de pensar no que posso fazer para ganhar, começo a pensar no que posso fazer para não perder.
- Mesmo assim, nesse momento, não é do técnico que eu preciso, mas de uma demonstração de humanidade, que é um dos deveres de qualquer técnico. Preciso de algum reconhecimento, naquela hora carregada de adrenalina pela qual estou passando. É pedir demais?
- Sei que posso vencê-lo e, mesmo assim, não vale a pena. Não gasto a energia necessária. Sinto uma estranha clareza a respeito da minha falta de empenho. É falta de inspiração, pura e simples.
- Mas não sinto que Wimbledon tenha me transformado. Sinto, na verdade, como se tivesse me permitido desvendar um pequeno segredo indecente: vencer não muda nada. Agora que venci um campeonato, sei de uma coisa que muito pouca gente no mundo pode saber. A intensidade de uma boa sensação pela vitória não é maior do que a péssima sensação de uma derrota, e um sentimento bom não dura tanto quanto um sentimento mau. Nem de perto.
- EMBORA NÃO FAÇA sentido, eu gostaria de voltar às quadras. Quero a dor que apenas o tênis propicia.
- Quando saio da quadra, tendo vencido em quatro sets, penso: Ele tem que amadurecer um pouco. Aí caio em mim. Será que eu realmente disse isso—a respeito de outra pessoa?
Caio de joelhos. Meus olhos se enchem de lágrimas. Olho para o meu camarote, para Perry, Philly, Gil e, em especial, para Brad. Você sabe tudo o que precisa saber a respeito das pessoas quando vê as expressões delas nos momentos do seu maior triunfo.
- sinto um impulso avassalador de perdoar, porque me dou conta de que meu pai não consegue ser diferente, que ele nunca conseguiu ser de outro jeito, assim como tampouco consegue me entender. Meu pai é o que é, e sempre será. Embora não seja diferente, embora não perceba a diferença entre me amar e amar o tênis, é amor, de qualquer maneira.
- A segunda pessoa a me telefonar é um repórter. Comento que estou feliz com a classificação. É uma ótima sensação ser o melhor possível. É mentira. Isso não é nem um pouco o que estou sentindo. É como eu quero me sentir. É o que esperam que eu sinta, o que eu digo a mim mesmo para sentir. Mas, na verdade, não sinto nada.
- Não importa quanto você vença: se você não é o último a vencer, é um perdedor.
- Eu deveria dormir durante o voo, mas, em vez disso, fico olhando fixo para o assento da frente e pensando em como tudo é tão frágil. Os próximos seis meses serão decisivos. A qual de nós essa terrível afirmação não se aplica?
- Digo a mim mesmo: E daí que você detesta tênis? Quem se importa? Todas essas pessoas lá fora, todos esses milhões que detestam o que fazem para viver e acabam fazendo mesmo assim. Talvez, praticar o que você detesta, mas bem e de maneira animada, seja a questão. Então você detesta tênis. Deteste quanto quiser. Mesmo assim, você ainda tem que respeitá-lo—e respeitar a você mesmo.
É para isso que estamos aqui. Para lutar em meio à dor e, quando possível, aliviar a dos outros. Tão simples. Tão difícil de perceber.
- Eu tinha me esquecido: é em corredores de hospitais que conhecemos o sentido da vida. Abraço-o e digo a ele que o amo e que vamos superar isso tudo.
- A não ser que eu aceite a minha realidade, jamais chegarei lá outra vez.
- No aquecimento antes do jogo, me dou conta de que estou a apenas quatro minutos do estúdio onde Brooke está gravando Suddenly Susan, do qual Perry agora é o produtor. O programa se revelou um sucesso imediato, e Brooke está ocupada, trabalhando doze horas por dia. Mesmo assim, parece estranho que ela não dê uma passada para assistir a algumas jogadas. Nem quando eu chego em casa ela pergunta a respeito da partida. Mas, eu também não pergunto sobre Suddenly Susan. Falamos sobre coisas. Não falamos sobre nada.
- Minha principal preocupação são as crianças em situação de risco. Os adultos podem pedir socorro, mas os pequenos não têm voz, não têm poder. Então, o primeiro projeto da minha fundação é um abrigo para crianças vítimas de maus-tratos e abandonadas, postas sob a custódia dos tribunais.
Penso em algo que Mandela disse uma vez numa entrevista: Não importa onde você esteja na vida, há sempre mais jornada adiante.
- E penso numa das citações preferidas de Mandela, do poema “Invictus”, que o sustentou naqueles momentos em que ele achou que sua jornada se havia interrompido: Sou o dono do meu destino,/ Sou o capitão da minha alma.
- Depois do jantar, Mandela se levanta e faz um discurso comovente. Seu tema: temos que cuidar uns dos outros—essa é a nossa tarefa na vida. Mas, além disso, temos que cuidar de nós mesmos, o que significa que precisamos ser cuidadosos em nossas decisões, cuidadosos em nossos relacionamentos, cuidadosos em nossas declarações. Temos de administrar nossa vida para não nos tornarmos vítimas.
- Por fim, Mandela fala do caminho que trilhou. Fala a respeito da dificuldade de todas as jornadas humanas—e, mesmo assim, há clareza e nobreza só no fato de empreendermos essa jornada. Quando finaliza e volta a se sentar, sei que minha jornada, comparada à dele, não é nada. Mesmo assim, não é isso que importa. Mandela está dizendo que toda jornada é importante, e que jornada nenhuma é impossível.
ISSO FOI, MAIS ou menos, o que senti ao deixar Mandela. É nisso que penso quando o helicóptero se afasta daquele complexo. Amo e venero os que sofrem, os que já sofreram. Agora estou mais próximo de um membro adulto da raça humana. Deus quer que cresçamos.
- Estou orgulhoso de você, diz ele. Por estar aqui, hoje. Nesta noite, véspera de Natal. Isso representa muito. Eu agradeço por ele estar ali comigo. Por abrir mão de sua véspera de Natal. Deve haver muitos outros lugares onde você preferia estar. Em nenhum outro lugar, afirma ele.
- Gil diz: Você não pode jogar, a menos que se sinta inspirado. Está dentro de você. Essa sempre foi a sua natureza, desde que você tem 19 anos. E você não consegue se sentir inspirado a menos que as pessoas à sua volta estejam bem. E eu amo você por isso.
- Se eu aprendi alguma coisa é que tempo e treinos resultam em conquistas.
- Na sala de parto, quando o médico me entrega Jaden Gil, me sinto maravilhado, arrebatado. Meu amor por ele é tamanho que sinto o meu coração se rasgar e expandir, como um fruto que, de tão maduro, chega a arrebentar. Mal posso esperar para conhecer, e saber mais sobre ele.
- me pergunto: Quem é este lindo intruso? Será que Stefanie e eu estamos prontos para receber em casa este absoluto desconhecido? Eu mesmo sou um desconhecido para mim. O que serei para o meu filho? Será que ele vai gostar de mim?
- É mais fácil se sentir livre e solto, ser espontâneo, depois de rir com as pessoas que você ama. Os acessórios certos.
- Acabo de perder o jogo e me sinto péssimo. Não quero voltar para a quadra amanhã. Tanto que cheguei a desejar ter uma lesão. Imagina só, não querer fazer alguma coisa a tal ponto que você acaba desejando se machucar. Jaden, se um dia você também se sentir derrotado por alguma coisa com a intensidade com que estou sentindo isso agora, apenas mantenha a cabeça baixa e continue em frente, trabalhando, dando o seu melhor. Encare o que há de pior e perceba então que não é o fim do mundo. Essa é a sua chance de alcançar a paz. Eu queria desistir, ir embora, voltar para casa e ver você. É muito difícil ficar e jogar, é muito fácil voltar para casa e estar com você. Por isso é que vou ficar.
- Mesmo que não seja a vida ideal, a gente sempre pode escolher como viver. E qualquer que seja a sua vida, escolher o que fazer muda tudo.
- Quando ganho dele, ao apertar sua mão sobre a rede, tenho vontade de lhe dizer que relaxe, que algumas pessoas aprendem um pouco mais devagar.
- Já ouvi, de antigos campeões, que o quinto set não tem nada a ver com tênis. É verdade. O quinto set depende de emoções e condicionamento.
- Digo aos jogadores: Vocês ainda vão ouvir muitos aplausos na vida, meus camaradas, mas nenhum será mais importante para vocês do que o aplauso dos seus iguais. Espero que, no final, todos vocês ouçam esse som.