Texto publicado no Jornal “Notícias do Dia” de Florianópolis/SC do dia 5 de fevereiro de 2021, em homenagem ao Berbigão do Boca, tradicional festa de abertura do carnaval ilhéu:
“Cessou-se o rufar do bumbo, calaram-se os tamborins. O cavaquinho ficou guardado e os foliões devidamente isolados – cada um no seu canto.
Ocorreu-me que esse ano não teremos Berbigão do Boca, a tradicional festa da Ilha, no centro da cidade. Não tem grande mérito a minha conclusão: seria impossível que tivéssemos Carnaval diante desta triste pandemia, mas me perguntei por que o “Berbigão” vai fazer tanta falta?
Na época de meus pais e avós, tenho a sensação que muita gente realmente se mobilizava para o Carnaval. Ruas e bailes, rapazes e moças, uma folia completa e não apenas um feriadão. O Carnaval era ansiado durante o ano inteiro, e a quarta-de-cinzas, além do simbolismo religioso, tinha caráter de um “fim” bastante cantado em antigos sambas.
Acontece que o Berbigão é mais. Não se trata de uma simples festa de abertura do carnaval ilhéu! Há 28 anos, cumpre sua função social e cultural, fixadas de maneira única na fisionomia mais humana de Floripa. Um encontro de sambistas, de todas as classes sociais: gente do morro, litoral e urbano, funcionários públicos e privados, turistas e curiosos, e sobretudo amantes dessa sexta-feira que antecede o Carnaval.
Ah, seus bonecos… Entre eles Zininho, o poeta maior; Aldírio Simões, o grande Mané; o compositor Luiz Henrique Rosa; a eterna cidadã samba Nega Tide e dezenas de outros, que representam não somente uma ausência pela partida mas uma presença como se falassem pra todos nós, no momento que erguemos a cabeça para os encarar: “Não deixem o samba ilhéu morrer!”
O Berbigão do Boca contém, ao menos para mim, significado filosófico, poético, sentimental que é ligado a vida de nossa cidade. E é nosso dever manter o pouco que nos resta, vivo.
Entremos em contagem regressiva: em 365 dias, se Deus quiser, estaremos vacinados, entoando a pleno vapor: “É festa pra rachar / É uma coisa louca / Vamos botar pra quebrar / No Berbigão do Boca!”.
Até lá!”